A
Saga de Euclides Pinto Martins e Seus Amigos
Já
perguntastes, alguma vez, qual foi o primeiro avião a cruzar o céu do
Brasil vindo dos EUA? E quem pilotava? Pois foi um cearense chamado EUCLIDES PINTO MARTINS.
Na verdade, ele era o co-piloto, mas lhe foi cedida a honra de assumir a nave
no espaço aéreo brasileiro por seu colega o piloto
WALTER HILTON. A aeronave foi um hidroavião biplano cedido pela
jornal "The New York Word"!
A
viagem começou em 4 de Setembro de 1922 e terminou a 8 de Fevereiro de 1923.
Sua
Vida
Euclides
Pinto Martins nasceu em Camocim, no Ceará, a 15 de abril de
1892. Entretanto, só foi batizado três meses depois, (28 de julho de 1892), na
Igreja Matriz de Macau, Rio Grande do Norte. O fato ocorreu porque seu
pai, Antônio Pinto Martins, natural de Mossoró, naquele estado, foi
convidado para representar a Companhia de Salinas Mossoró Assú,
em Macau. Por isso, Pinto Martins foi batizado na
Matriz de Macau e registrado no Cartório Civil
daquela cidade.
Sua mãe chamava-se Dona Maria Araújo do Carmo
Martins e dedicou-lhe muito amor e carinho. Euclides era um menino
bem
criado e de inteligência incomum. Aos cinco anos, (1897) já começava a estudar na escola pública local.
Três anos
depois,
(agosto de 1900), seus pais se mudaram para Natal e o
jovem teve que continuar seus estudos primários no Colégio Americano, conhecido como Colégio
das Capas Verdes.
Em 1903, já com 11 anos, se
transferiu para o
Colégio
Atheneu Norte Rio Grandense e, paralelamente, ingressou num curso noturno
de náutica. Observem aí, o seu gosto pelas viagens e aventuras.
Quatro
anos mais tarde, (1907), embarcou no navio "Maranhão" saindo no ano seguinte,
para ser segundo piloto do navio "Pará". Infelizmente, um acidente
de bordo interrompeu esta rápida carreira naval e, Euclides, com problemas na carótida,
desembarcou em Natal sendo aconselhado pelos médicos a abandonar a carreira.
No
início de 1909, seu pai mandou-o para os EUA com US$300,00 e uma
recomendação para que uma empresa de amigos lhe repassasse uma certa
quantia mensal para sua manutenção.
Euclides não perdera tempo, matriculou-se no "Drexell Institute" na
Filadélfia onde, três anos depois se formaria em
Engenharia Mecânica. (1911). Além de estudar, Pinto Martins
trabalhava como estagiário na "Baldwin Locomotive", uma
fábrica de vagões. Ali, o jovem aprendeu a falar inglês rapidamente e se
inseriu na sociedade local, conquistou uma namorada e se casou com a Srta. Gertrudes Mc
Mullan.
Nosso
herói regressou ao Brasil logo após a formatura, (1911) desembarcou do navio "Booth Line", em Fortaleza.
Convidado por seu pai, viajou para Natal, onde passou a trabalhar como
engenheiro na "Inspetoria Federal de Obras Contra a Seca" e na Estrada de Ferro.
Como seu pai era maçom, Euclides
Pinto Martins acompanhou-o
e ingressou na loja maçônica "21 de Março".
Em
Natal - Rio Grande do Norte, nasceu em 1914 sua primeira filha: Ceres,
que viria a morrer, tragicamente, aos 31
anos de idade num acidente de avião em Porto Rico, com seu
marido.
A
vida de Euclides Pinto Martins foi marcada por constantes viagens e
mudanças. No final da 1º Grande Guerra, (1917) ele se mudou para Recife onde viveu por 2 anos. Ali,
ingressou na Loja "Segredo
e Amor" (Loja Maçônica). A maçonaria foi outro fato marcante na vida
de Pinto Martins e isto será tema de um novo trabalho.
Em
1918, faleceu sua jovem mulher e Euclides, muito sentido,
retornou aos EUA.
Apesar da dor da perda, acalentava no
peito o desejo de uma grande aventura entre o Brasil e EUA.
Procurou
parcerias e acabou se associando a Ladislau do Rego, que
juntos, compraram um navio com a
idéia de criar, no Brasil, uma companhia de navegação de cabotagem.
Lamentavelmente, o negócio não deu certo, pois o navio afundou...
Euclides
permaneceu na América, enquanto seu sócio neste negócio
fracassado, voltou ao Brasil terminando assim, sua primeira
tentativa de fazer algo grandioso.
Euclides não
esmoreceu, casou-se novamente com uma americana Adelaide Sulivan.
Adelaide era advogada e doze anos mais velha que seu marido, tendo
lhe dado em 1920, uma filha: Adelaide Lillian.
O
Avião
Euclides
Pinto Martins não se conformou apenas com a navegação marítima.
Colocou seu foco na aviação que se desenvolvia de forma
espetacular por causa da guerra. Como parte desta idéia,
Euclides entrou num
curso de aviação e conseguiu o "brevet" de piloto em
1921. Com sua entrada no meio aeronáutico, conheceu um
veterano na área: Walter Hilton, instrutor de vôo na Flórida. Com
este novo amigo e a afinidade de idéias, Euclides resolveu confidenciar a
respeito de um velho sonho: Atravessar o Atlântico numa viagem de avião Nova
Iorque-Rio de Janeiro desbravando assim, essa rota
aérea. A idéia encontrou eco na mente de seu
colega e, juntos, começaram a trabalhar. Lutaram com força de vontade
e, finalmente, conseguiram um banqueiro: Andrew Smith Jr. que asseguraria verbas para o
atrevido projeto. Assim, contrataram da Fábrica Curtis um
hidroavião biplano com 28 metros de envergadura e dois motores
"liberty" de 400 hp, cada. A máquina voadora pesava oito
mil quilos! Depois do avião pronto decidiram batizá-lo de "Sampaio
Corrêa" em
homenagem ao Senador e Presidente do Aeroclube do Rio de
Janeiro.
Tudo
pronto, avião novinho em folha! A tripulação:
Piloto Walter Hinton, co-piloto - Euclides Pinto Martins, mecânico de
bordo - Jonh Edward Wilshusen da Fábrica Curtiss e para
retratar a travessia George Thomas Bye, jornalista do "New York
Word" e o cinegrafista John Thomas Baltzel da Pathé News.
A
Viagem
O
hidroavião com sua equipe deveria decolar no dia 16/08/1922, mas ao
colocá-lo no Rio Hudson, houve uma pequena avaria na asa esquerda,
adiando então sua partida. Por fim, no dia 17 de agosto de 1922,
decolou do estuário
do Hudson o majestoso "Sampaio Corrêa", aplaudidos por milhares de
pessoas!
A meteorologia que iniciava seus estudos, previa riscos de
tempestades mas a equipe, afoita, não se importou e
decolou sumindo no horizonte, assistidos das margens do Rio Hudson
entre as ilhas de Manhatam e New Jersey. Vamos ver o depoimento da
"Revista Semana" do
Rio de Janeiro, sobre a decolagem:
"
A Doca do North River, diante da Rua 86, parecia mais um formigueiro
humano. Mais de um milhão de pessoas havia se aglomerado de
encontro ao cais com os olhos fixos no grande pássaro mecânico. O
hidroavião Sampaio Corrêa, pintado de novo, ostentava nos flancos
as bandeiras consteladas das
duas grandes repúblicas irmãs. Às 15:00
horas contadas uma por uma nos relógios da cidade, os
possantes motores começaram a roncar soturnamente. Com
quatro ou cinco manobras hábeis o aparelho movia-se, evoluía
entre embarcações apinhadas de gente, procurando a parte mais
ampla e livre do rio. Houve então um prodígio. Erguendo-se
daquele milhão de almas em desatino, dez talvez cem milhões de
vivas atroaram os ares. Concentraram-se neles, durante largo tempo,
todos os rumores da metrópole tumultuosa e fervilhante. Nova
Iorque que palpitou naquele brado, partido daquelas bocas de todas
as idades, de todos os feitios, de todas as condições.
Dir-se-ia
que era a boca da cidade que gritava".
A
verdade é que, apesar de saberem estar na época de grandes temporais,
nossos afoitos aventureiros, se atreveram a iniciar a viagem. Neste
mesmo dia, 17 de agosto, o avião foi obrigado a pousar em Nanten, por
causa de um forte temporal. Pernoitaram ali, e decolaram de manhã com
destino a Southport, onde chegaram dia 19/08. Prosseguiram viagem e
dia 20 chegaram em Charlston, sem dificuldades. Reiniciaram a viagem e
tiveram que pousar em West Palm Beach devido a outro temporal.
Partiram dia 21 às 11:00 horas e amerissaram em Nassau, onde
pernoitaram, seguindo de manhã com destino a Porto Príncipe no Haiti.
Neste trecho foram surpreendidos por forte borrasca, perderam altitude
e caíram no mar por volta das 20:00 horas, ao leste da ilha de Cuba,
além do Cabo Maisi.
As coisas nesta noite ficaram pretas! Nossos
aventureiros estavam em pleno Atlântico, escuridão total, riscos
de tubarões e afogamento. Felizmente, não ficaram feridos na queda. O
"Sampaio Corrêa" ainda flutuava e eles localizaram as pistolas sinalizadoras,
encontradas com dificuldades no escuro. Assim os fogos de artifícios
iluminaram os
céus do oceano, naquela noite, num desesperado pedido de socorro!
Lamentavelmente, estes sinais não foram vistos... A
situação tendia a complicar, pois no avião entrava água por
buracos feito pela colisão com o mar. Foi neste clima de preocupação,
que Pinto Martins
com seus bons conhecimentos de náutica, lembrou-se que tinham uma
lanterna grande, a qual achou numa parte do avião, ainda seca. O
jovem intrépido subiu no nariz da nave naufragando e passou a fazer sinais luminosos de
socorro. Não demorou muito, pois perto dali, a Canhoneira da Marinha
Americana
"Denver", viu os sinais luminosos e apitou, seguindo em
socorro dos náufragos. Foram feitas tentativas, em vão, de rebocar o
"Sampaio Corrêa" que acabou indo para o fundo do mar sob
os olhares tristes de nossos aventureiros...
O
próprio Pinto Martins deu a seguinte declaração ao Jornal do
Brasil: "...sendo
piores possíveis as condições
atmosféricas, os aparelhos de altitude perderam a precisão.
Reinava forte cerração e quando acreditávamos estar muito
acima do nível das águas, nela batemos com violência. Com a
força do choque o aparelho furou e foi invadido pela água..."
Avião
perdido. Os náufragos foram levados para a Base Naval de
Guantânamo, em Cuba.
Pinto
Martins e seus amigos não enfraqueceram, continuaram com a idéia de provar que uma
rota aérea ligando as Américas (norte e sul) era viável. Assim,
acabaram
conseguindo que o Jornal "The New York Word" lhes dessem
um outro avião para continuação da viagem. Viajaram para Flórida, Escola Naval de
Pensacola, onde outro avião
adquirido pelo Jornal os esperava. Era um hidroavião com seis
anos de uso, que pertencera a Base. Graças a esta doação, em 04 de Setembro do mesmo
ano, em São Petersburgo, na Flórida receberam a nave e batizaram-na
de
Sampaio Corrêa II.
Nossos aventureiros
continuavam afoitos e logo
decolaram da Flórida, pousando em Porto Príncipe no
Haiti em 07/09. Ali, com problemas no sistema de
refrigeração do avião ficaram 30 dias parados, até que peças de
reposição chegassem de navio dos EUA. Aos sete dias do mês
de outubro, decolam novamente com destino a São Domingos, República
Domenicana, onde pernoitam, seguindo para Porto Rico. Continuaram a viagem,
chegando em Guadalupe e partiram para Martinica onde pousaram em 12 de
outubro. Avião no ar novamente, com muitas dificuldades
causadas por chuvas, chegam em Port Spain, Trindad e Tobago, dia 15 de outubro. Ali, perderam mais 30 dias com
troca de hélices e outros consertos. Em 21 de novembro, decolam
para Georgetown na Guiana Inglesa, dali para Paramaribo,
Guiana Holandesa, Caiena , Guiana Francesa e, finalmente em
1º de Dezembro, pousam no Brasil, Estado do Pará, no Rio Cunani,
ao norte da foz do Rio Amazonas.
Os rapazes ávidos por aventuras e
estas não faltavam, prosseguem para a Ilha
de Maracá, Belém, e Bragança onde obrigados por um temporal
pousam no Rio Caeté. Passaram três dias em Bragança seguido
viagem para São Luis. Às 12:00 horas do
dia 14 de Dezembro, o Sampaio Correia desce na Baia de São
Marcos desembarcando na ilha de São Luis, no Maranhão, dia 14,
onde ficaram até dia 19.
Finalmente, quatro horas e meia depois
da decolagem, (dia 19 de Dezembro) pousam em Camocim, terra
natal de Pinto Martins. Depois das muitas já conhecidas homenagens, partem
no dia seguinte para Aracati, sem pousar em Fortaleza por
dificuldades de amerissagem nas águas agitadas da enseada do
Mucuripe.
Pernoitaram em Aracati e voaram para
Natal onde dormiram um sono reparador. Logo bem cedinho, decolavam em
direção ao sul. Mal viajaram 50 milhas quando o motor de bombordo
apresentou um problema. Estavam sobrevoando ainda o território
Potiguar, perto de Conguaretama, Bahia Formosa, e uma grave pane no
motor esquerdo que forçou-os a amerissar na citada Baía. Analisado o
motor descobriram que algumas engrenagens estavam irremediavelmente
danificadas e tinham que ser substituídas. Só conseguiram o
conserto das peças em Pernambuco, mais exatamente em Recife. Pinto
Martins, que havia viajado para resolver o problema
retornou, dias depois, com as peças para reparar o motor.
Foi
com
muita dificuldades que decolaram de Bahia Formosa, rumo a Recife. Nova
pane os forçou descer em Cabedelo, sendo que desta vez a coisa era bem
pior. A viagem quase terminou por ali, não fosse o Comandante da
Aviação Naval, Capitão de Mar e Guerra, Protógenes Guimarães que, vendo
a situação desesperadora dos viajantes com o motor irrecuperavelmente
danificado, doou-lhes um novo! Esta simpática doação possibilitou a
continuação da viagem.
O
futuro mostraria que este Comandante teria pela frente uma bela carreira e
chegaria a ser Ministro da Marinha.
Trocado o malfadado motor, eles
decolam de Cabedelo e pousam no Recife. Ali, como em todos os
lugares que pararam, foram muito bem recebidos, com festas, visita
ao Governador enfim, todas as honrarias de heróis. Euclides, em
Recife, teve a alegria de abraçar seu pai e suas duas irmãs,
Abgail e Carmen. Daí para frente, a viagem seria tranqüila pois estavam
no nordeste e a possibilidade de mal tempo era mínima.
Ficaram
em Recife por 3 dias e seguiram viagem às 11:00 horas rumo
as Alagoas, pousando em Maceió onde permaneceram até o dia seguinte.
Dali até Salvador, após as festas costumeiras, foram apenas 3
horas e 50 minutos. Na capital baiana, as festas e homenagens foram
muitas. Autoridades diversas, inclusive o Cônsul Americano que
prestigiou as cerimônias de saudações aos conquistadores da
travessia!
Partiram
no final da semana, 04 de fevereiro, às 12:55 pousando em
Porto Seguro às 16:30h. Após reabastecer o avião e tendo tido uma
noite tranqüila, partem de manhã, 8:50h para Vitória
no Espírito Santo. Eram 12 horas e 12 minutos quando tem
inícios as festividades de recepção aos "viajores" do ar!
A
Chegada
Faltava
pouco para a chegada ao Rio de Janeiro e era necessário
programar pois, uma esquadrilha da Aviação Naval, planejava
escolta-los ao local da chegada!! Autoridades estariam presentes,
afinal seria a grande conquista de uma rota que viria a ser explorada,
no porvir, por grandes empresas de aviação mundial!!
Partiram,
ansiosos, às 12:30 h., com destino a Cabo Frio e depois Rio de Janeiro!
Amerissaram em Cabo Frio às 15:15 horas em 7 de fevereiro onde
pernoitaram.
Às
10:35 h. decolaram voando sobre Araruama, Saquarema, Maricá e
demais localidades costeiras fluminenses. Finalmente, às 11:32 horas do
dia 8 de fevereiro de 1923. o avião é avistado sobrevoando a
Baía da Guanabara! Ao pousar foram recebidos na lancha "Independência"
do Ministério da Marinha onde o primeiro a ser abraçado pelo
Senador Sampaio Correia foi Pinto Martins seguido por
Hilton, o piloto, George Thomas, o jornalista e por fim o
cinegrafista, John Thomas que, afinal, filmava o
evento!!
Vários
dias de festas e glórias
aconteceram no Rio de Janeiro.
Sua
Morte
Apesar
de tantas glórias, Euclides Pinto Martins teve muitas dificuldades conseqüentes
de suas aventuras. Dívidas adquiridas precisavam ser pagas. Após o
"Raid", a fama e a glória, ele sentia o peso de ser um
homem comum e com pouco dinheiro. Sua mulher se recusava a morar no
Brasil e entrara com a ação e divórcio. Estava sendo pressionado
para pagar o dinheiro emprestado para financiar o evento (U$19.000).
Foi neste clima que, tristemente, encontraram Pinto
Martins morto em seu quarto com um tiro na cabeça vitimado
talvez por uma crise de depressão. Era o dia 12 de abril de 1924,
pouco mais de um ano depois de tão glorioso feito.
Nada
mais se sabe
a respeito de sua morte dada oficialmente como suicídio. Em
profundo respeito a este grande conquistador nos limitaremos a
reproduzir as palavras de seu pai sobre seu desaparecimento:
"Está
provado que ele chegou a este estado de desespero levado por
privações muito cruéis... Sua morte foi conseqüência da
dignidade e altivez de seu caráter.
.."
Nossos profundos respeitos, aviador!!!
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário